quinta-feira, agosto 16, 2012

Da série “A Fenomenologia do Ser”¹ [16]


Qual será a origem do insuportável cheiro a bafio que impregna o discurso moralista de PPC? Qual será a razão do tropismo de PPC para substituir o discurso político por sermões de meia tigela em estilo de pregador tele-evangelista?

A razão parece-me simples de compreender.

PPC é um produto típico do magma cultural que actua como uma espécie de ruído de fundo na cultura política em Portugal.

Refiro-me como é evidente a essa mixórdia de salazarismo, catolicismo e reaccionarismo que emerge espontaneamente sempre que PPC discursa fora da vulgata ideológica economicista e, julgará ele, liberalizante. E esses afloramentos resultam de PPC – como Relvas, por exemplo – não ter construído em devido tempo uma identidade política própria assente numa sólida e consistente formação escolar, cultural e política.

Na verdade, o que diferencia PPC do taxista é apenas a fina camada de verniz que a origem social e o convívio político lhe permitiram acrescentar a essa identidade primária que recebeu pelo simples facto de existir neste tempo, neste lugar e nesta sociedade.

De facto,
    Ce qu’il y a de plus profond dans l’homme, c’est la peau.
        Valéry, P. L’Idée fixe, La Pléiade, II, p. 215.

________
¹ Obra filosófica que o actual primeiro-ministro afirmou ter lido na sua juventude, desde então, perdida.

3 comentários :

james disse...

Subscrevo inteiramente este post.

Anónimo disse...

"Fenomenologia do marisco - ou do camarão de classe"

Um tuga pobre visita um tuga rico e pede-lhe dinheiro emprestado, já que anda de bolsos vazios, o ordenado que lhe pagam é miserável, anda triste, não pode apreciar a vida.

O Tuga rico empresta-lhe o dinheiro ao juro de mercado.

Mais tarde, na ida para casa o tuga rico vê o tuga pobre no Rossio a comer camarão. Escandalizado aproxima-se e reclama:

- então você queixou-se de que lhe pagam mal, que anda triste, de bolsos vazios e aí pede-me dinheiro emprestado e vem comer marisco!? Você é um irresponsável, vive acima das suas possibilidades e ainda se queixa.

Ao que responde o tuga pobre:

- fosga-se! Se não tenho dinheiro não posso comer marisco; se tenho dinheiro não devo comer marisco - quando então é que eu vou comer marisco!?*

Moral da história: pão com margarina.

(*Adaptado de Freud, S., "Os chistes e a sua relação com o inconsciente")

João.

Rosa disse...



Excelente, João.
Bem como o post do Afonso.